A chegada de Tony Hawk’s Pro Skater 3 + 4 não foi um evento comum; foi um reencontro com uma era, um eco distante dos ollies e grinds que definiram a minha própria jornada no universo dos videojogos. Como um entusiasta que cresceu a desbravar pistas virtuais, a promessa de revisitar os clássicos Pro Skater 3 (2001) e Pro Skater 4 (2002) da Neversoft, agora reimaginados pela Iron Galaxy e publicados pela Activision, despertou em mim uma expectativa que transcende a simples curiosidade.
A Coreografia do Asfalto
Mergulhar em Tony Hawk’s Pro Skater 3 + 4 é como calçar os meus ténis de skate favoritos (controle do PS2) novamente, sentindo a familiaridade do asfalto sob os pés. A sensação de controle é instantaneamente reconhecível, fluida e incrivelmente intuitiva, tal como nos remakes anteriores. É aquela magia arcade que nos transporta para um universo onde a gravidade é apenas uma sugestão e os combos podem estender-se por uma eternidade. O sistema de combos, com os reverts (introduzidos em THPS 3 e já integrados em THPS 1 + 2) e as mecânicas de skitching expandidas (originárias de THPS 4, agora utilizáveis em combos e estendidas aos níveis de THPS 3), permanece o coração pulsante da experiência. É uma dança viciante, profundamente gratificante, e a razão pela qual as horas se desvanecem sem que se perceba.
No entanto, existe um ponto de negativo que não posso ignorar: a reimaginação do modo carreira de Pro Skater 4. O THPS 4 original era célebre pela sua estrutura mais aberta, onde os objetivos eram iniciados através de conversas com NPCs. Neste remake, todos os níveis, incluindo os de THPS 4, estão agora confinados ao formato clássico de 2 minutos.
Para mim, esta é uma decisão em que carrega dois valores. Por um lado, simplifica a fórmula, alinhando-a com a experiência arcade dos primeiros jogos, o que é ideal para sessões rápidas e para quem aprecia o speedrunning. Por outro lado, compreendo perfeitamente a desilusão dos puristas de THPS 4. Aquele sentido de exploração, de um mundo mais “vivo” onde os objetivos eram descobertos organicamente, foi sacrificado. É uma “reimaginação” em vez de um remake fiel, e isso altera a identidade do THPS 4. A opção de 60 minutos para livre circulação é um bom compromisso, mas a ausência dos objetivos baseados em NPCs ainda se faz sentir.
O jogo também me surpreendeu com um modo New Game+ aprimorado, que apresenta “Pro Goals” que me desafiam a explorar linhas complexas e aspetos dos níveis que antes estavam ligados às missões mais exploratórias de THPS 4. É uma forma inteligente de reutilizar o conteúdo e adicionar uma camada de profundidade.
E o multijogador? Ah, o multijogador! É um pilar central, com suporte para jogo multiplataforma para até oito skatistas. Modos competitivos clássicos como Trick Attack, Combo Mambo e Graffiti regressam em plena forma, tão viciantes como sempre. Mas a verdadeira joia é o novo modo “HAWK”, uma espécie de caça ao tesouro onde os jogadores escondem e encontram letras. É uma adição engenhosa que infunde uma camada de diversão inesperada. E para aqueles momentos de convívio no sofá, os modos cooperativos locais, como HORSE e Tag, continuam a ser uma delícia em ecrã dividido.
A Arte de Desafiar a Gravidade
As mecânicas de Tony Hawk’s Pro Skater 3 + 4 são a essência da sua natureza viciante. A fluidez com que se encadeiam grinds, manuals, reverts e lip tricks é simplesmente divertido. A introdução do revert em THPS 3 foi um momento transformador para a série, e a forma como a Iron Galaxy o integrou de maneira tão perfeita em todos os níveis, incluindo os de THPS 1 + 2, é um testemunho da sua profunda compreensão do que torna esta franquia tão especial.
A mecânica de skitching, que me permite agarrar-me à traseira de veículos (ou elefantes, se a pista for o Zoo!), foi expandida, e agora posso até encadeá-la em combos, o que abre um leque de possibilidades criativas que antes não existiam. É uma alteração boa, mas que tem um impacto significativo na forma como abordo cada nível.
Contudo, é nos modos Create-A-Skater e, especialmente, no Create-A-Park que o jogo realmente brilha em termos de mecânicas e criatividade. O Create-A-Skater permite-me personalizar o meu avatar com uma vasta gama de roupas e decks, embora, para ser honesto, sinta que poderia ter sido um pouco mais aprofundado. É funcional, mas não revolucionário.
No entanto, o Create-A-Park é, sem sombra de dúvida, o editor de níveis mais robusto que a série alguma vez viu. A capacidade de construir os meus próprios parques de skate com uma infinidade de rampas, corrimões e obstáculos é fantástica. Mas a verdadeira inovação, a funcionalidade que me fez perder horas a fio, é a possibilidade de criar objetivos personalizados dentro dos meus parques e partilhá-los com amigos. Isto é um divisor de águas.
E o elenco de skatistas? É o maior da história da série, com um total de 31 profissionais. Ver lendas como Tony Hawk, Bucky Lasek e Rodney Mullen lado a lado com novos talentos como Rayssa Leal, Margielyn Didal e Yuto Horigome é uma experiência gratificante. E as personagens bónus? O implacavel Doom Slayer e um Revenant da franquia Doom, o icónico Michelangelo das Tartarugas Ninja (baseado na sua representação do filme de 2023) e o regresso hilariante de Jack Black a reprisar os seus papéis como Officer Dick e Constable Richard. É uma mistura eclética que infunde um toque de loucura e diversão que só Tony Hawk consegue proporcionar.
Sinfonia e Esplendor Urbano
A primeira impressão ai jogar o Tony Hawk’s Pro Skater 3 + 4 no meu PS5 foi o seu impacto visual. É simplesmente deslumbrante. Os níveis originais, tanto de Pro Skater 3 quanto de Pro Skater 4, foram meticulosamente refeitos, apresentados em gloriosa resolução 4K. É aquela sensação peculiar de “sempre pareceu tão bom assim, certo?”. As texturas são visivelmente aprimoradas, as animações são mais fluidas e os efeitos de iluminação dão vida aos ambientes icónicos de uma forma que nunca antes presenciei. Sentir o calor do metal fundido na Foundry ou observar o pôr do sol em San Francisco é uma experiência que evoca nostalgia e, ao mesmo tempo, me faz apreciar a modernização.
Locais familiares como Foundry, Airport e Skater Island de THPS 3, e College, San Francisco e Alcatraz de THPS 4, estão todos lá, parecendo simultaneamente nostálgicos e frescos. Mas a Iron Galaxy não se limitou a refazer o que já existia. Eles introduziram novos mapas que são, na minha opinião, alguns dos melhores de toda a coleção. O Waterpark, com os seus escorregas e piscinas vazias, é um paraíso para o skate, e o nível Pinball é visualmente impressionante e incrivelmente divertido. É quase inacreditável que um parque aquático não tenha existido antes num jogo Tony Hawk.
No entanto, nem tudo é perfeito. Senti a ausência de alguns níveis originais de THPS 4, como Chicago e Carnival. É uma pena, pois eram mapas com personalidade própria, e a sua falta é é bastante decepcionante.
E a banda sonora? Esta é, para mim, a maior ferida aberta do jogo. A música sempre foi uma parte intrínseca da identidade de Tony Hawk’s Pro Skater, um gatilho poderoso para a nostalgia e a adrenalina. O jogo inclui uma seleção de clássicos que definem o espírito rebelde da série, como “Ace of Spades” dos Motörhead, “The Boy Who Destroyed the World” dos AFI e “96 Quite Bitter Beings” dos CKY. E sim, há uma abundância de novas faixas, elevando o total para 59 músicas.
Mas a verdade é que a ausência de muitas faixas “essenciais” e “banger” das bandas sonoras originais de THPS 3 e THPS 4 é muito triste. Apenas 6 de 20 músicas de THPS 3 e meras 4 de 35 de THPS 4 estão no Remake. Isso representa menos de 20% das músicas originais combinadas! Para mim, isso é muito deepcionante. A atmosfera do jogo é alterada, e a nostalgia é diluída. Embora eu entenda que os custos de licenciamento de música são proibitivos hoje em dia, isso não diminui a desilusão.
A Fluidez da Pista Perfeita
No que diz respeito ao desempenho na PlayStation 5, Tony Hawk’s Pro Skater 3 + 4 é, na sua maioria, uma experiência impecável. O jogo corre nativamente em resolução 4K com uns suaves 60 frames por segundo (FPS) no seu “Modo Fidelidade”. A fluidez é notável, e cada ollie, grind e manual sente-se incrivelmente responsivo e preciso. É o tipo de desempenho que se espera de um título de nova geração, e a Iron Galaxy entregou isso em or do que esperar por um nível quando se está no fluxo de um combo.
O Eco de um Legado
Após incontáveis horas a deslizar por corrimões, a saltar sobre telhados e a encadear combos que desafiam a lógica, a minha conclusão sobre Tony Hawk’s Pro Skater 3 + 4 na PlayStation 5 é cristalina: é um regresso triunfante, mas com cicatrizes visíveis. É um jogo que, em grande parte, cumpre a promessa de modernizar uma experiência clássica, construindo com confiança sobre a base sólida que THPS 1 + 2 estabeleceu.
Contudo, este não é um remake perfeito, e é crucial que o encaremos como tal. As decisões de design em relação ao modo carreira de Pro Skater 4, transformando a sua natureza de livre circulação num formato de 2 minutos, e as notáveis omissões na banda sonora icónica, deixam um sabor agridoce. Para mim, THPS 3 foi lindamente modernizado, uma recriação fiel que evoca a mais pura nostalgia. Mas THPS 4? Esse é mais uma “reimaginação” do que um remake direto, uma versão que, embora divertida, perdeu parte da sua alma original no processo.
Tony Hawk’s Pro Skater 3 + 4 é um testemunho da diversão intemporal que esta série oferece. É um jogo que me faz sorrir, que me desafia a superar os meus próprios limites e que me lembra porque me apaixonei por estes jogos de skate arcade. É um “remake sólido” com as suas ressalvas, uma coleção que, apesar das suas falhas, ainda consegue entregar a adrenalina e a liberdade de deslizar por um mundo de possibilidades. Mas, mais do que isso, serve como um lembrete poderoso para os criadores de remakes: a nostalgia é uma força potente, mas a fidelidade à essência original, especialmente em elementos tão cruciais como a estrutura de jogo e a trilha sonora, é um equilíbrio delicado que, se não for mantido, pode deixar os fãs mais dedicados a sentir que algo se perdeu no caminho.
É um jogo que conseguiu me divertir por muitas horas, mas que me deixa a sonhar com o que poderia ter sido se cada pixel e cada nota musical tivessem sido tratados com a mesma reverência que eu vivi na minha infancia. É Tony Hawk, sim, mas um Tony Hawk que me faz pensar no passado enquanto patino para o futuro.