Desde que ouvi falar de Heroes of Mount Dragon, algo chamou minha atenção. Um brawler de rolagem lateral, em 2025, em meio a um mercado lotado de mundos abertos e gráficos realistas? A proposta da RuniQ de revisitar um gênero clássico com a adição de transformações dracônicas era, no mínimo, ousada. Lançado para PC via Steam em 25 de junho, o jogo não tenta apenas reviver uma fórmula antiga — ele assume um risco calculado. Um estúdio formado por veteranos de peso, com passagens por Beenox e Ubisoft, usando sua bagagem em títulos como Crash Team Racing Nitro-Fueled e Call of Duty, agora mergulha de cabeça numa experiência com cara de retrô e acabamento moderno.

Minha dúvida era clara: Heroes of Mount Dragon seria só um tributo estilizado, ou algo que pudesse, de fato, marcar seu espaço? Um beat ’em up 2.5D que traz à tona o espírito de Golden Axe, mas com o diferencial de poder se transformar em um dragão durante o combate, não passa despercebido. Os modos singleplayer, co-op e até competitivos reforçam a ideia de que há ambição por trás do projeto. E com meu PC pronto para o embate, era hora de descobrir se o Monte Dragão guardava mais do que promessas.

Ecos de um Conto Esquecido

Explorar o mundo de Üna em Heroes of Mount Dragon foi como abrir um livro de fantasia inesperado. Embora a narrativa não seja o foco principal de um brawler, o jogo apresenta um enredo coeso e bem estruturado. Üna é um reino à beira do colapso, e o desaparecimento do Dragão Celestial — a última criatura de sua espécie — ameaça romper o equilíbrio do mundo. Assumimos o papel dos Dragon-Souls, guerreiros escolhidos para investigar o desaparecimento e restaurar a ordem.

A forma como essa história é transmitida merece destaque. A RuniQ escolheu uma abordagem que remete à fantasia clássica, com narração em off e visuais coloridos que lembram os desenhos animados dos anos 90 inspirados em Dungeons & Dragons. Os personagens têm visuais marcantes e bem definidos, com traços que remetem a RPGs de mesa e alguns me lembram personagens da Saga de Warcraft. Há um equilíbrio entre humor e leveza que mantém a narrativa acessível, sem perder a identidade do universo.

Um ponto especialmente interessante é a origem da história: o jogo é baseado em um jogo de tabuleiro, que também inspirou uma série de nove livros. Seis volumes já foram lançados, com os três finais em desenvolvimento. Essa profundidade de material não é comum em jogos independentes. Ela oferece uma base rica para o mundo e os personagens, mesmo que o jogo explore apenas parte desse conteúdo.

Apesar da riqueza do universo, o jogo falha em um ponto essencial: a ausência de dublagem nos diálogos entre os personagens. A narração geral é bem executada, mas a falta de vozes nas interações diretas enfraquece a imersão. Muitos jogadores devem acabar ignorando os textos, o que reduz o impacto da história. Considerando o investimento na construção de lore e ambientação, essa escolha parece um desperdício de potencial. Com dublagem completa, a narrativa teria mais força para acompanhar o ritmo da ação.

A Sinfonia da Destruição Dracônica

No coração de Heroes of Mount Dragon está a jogabilidade — e é aqui que o título realmente se destaca. A ação segue o estilo clássico dos brawlers de rolagem lateral, com controles responsivos que facilitam a entrada de qualquer jogador, seja iniciante ou experiente. A RuniQ aprimorou o sistema de combate desde as versões preliminares, ajustando o ritmo das batalhas, equilibrando os encontros e eliminando interrupções que quebravam a fluidez dos combos. O resultado é uma pancadaria consistente, com dificuldade ajustável que respeita o nível de cada jogador.

A escolha dos heróis é um dos pilares da experiência. No lançamento, há quatro personagens jogáveis, com a promessa de mais quatro sendo adicionados futuramente. Cada um deles possui um estilo de combate próprio, refletindo suas “almas dracônicas” tanto na jogabilidade quanto nas habilidades. A mecânica central — a metamorfose em dragão — não é apenas estética. Ela altera completamente o ritmo da luta, introduzindo novos ataques, sopros elementais, malabarismos aéreos e combos em área. Essas transformações geram interações interessantes em combates cooperativos, permitindo estratégias em cadeia e efeitos combinados entre os jogadores. A diversidade entre os heróis — com arquétipos focados em agilidade, força ou magia — garante variedade real no campo de batalha.

Para evitar a repetição, um problema recorrente no gênero, Heroes of Mount Dragon aposta em dois sistemas eficazes. O primeiro é justamente a transformação dracônica, que muda o estilo de jogo e exige adaptações constantes. O segundo são as maldições — modificadores caóticos aplicados nas partidas, que afetam habilidades, movimentação ou até o ambiente. Esses efeitos imprevisíveis, especialmente nos modos competitivos, injetam dinamismo e imprevisibilidade nas lutas. A promessa de novos heróis conectados diretamente ao universo literário da franquia reforça que os conteúdos pós-lançamento têm propósito narrativo, e não são apenas adições genéricas.

Nos modos de jogo, o título oferece tanto conteúdo solo quanto multiplayer. No Modo Aventura, é possível jogar com até três amigos, tanto online quanto no clássico co-op local. A cooperação torna as lutas mais estratégicas e acrescenta um senso de progresso coletivo. Para quem prefere competição, o Modo Competitivo — introduzido ainda no beta — permite batalhas diretas entre jogadores, com variações baseadas em pontuação, tempo ou sobrevivência. Há também desafios extras, corridas e modos especiais, que ajudam a manter a experiência variada e com bom ritmo.

A RuniQ acerta ao equilibrar acessibilidade e profundidade. Os controles são diretos, mas permitem domínio técnico, e o jogo se adapta bem a diferentes perfis de jogador. Essa atenção aos detalhes reforça a proposta do estúdio: resgatar o espírito dos beat ‘em ups clássicos com uma estrutura moderna e longeva.

O Coração Pulsante do Combate

As mecânicas de Heroes of Mount Dragon são o que realmente o diferenciam de outros brawlers. A metamorfose dracônica é o centro da experiência. Mais do que um recurso visual chamativo, ela altera completamente o estilo de combate. Ao ativar esse poder, o herói assume uma forma dracônica que substitui os ataques convencionais por investidas de área, projéteis elementais e combos de grande impacto. Essa transformação exige tomada de decisão constante — usar cedo para limpar o campo ou guardar para momentos críticos contra chefes. A transição entre o combate ágil na forma humana e o poder bruto da forma dracônica cria uma dinâmica tática que mantém os confrontos intensos.

Outro destaque mecânico são as chamadas “maldições”, aplicadas em modos competitivos e ocasionais desafios cooperativos. Elas afetam diretamente a jogabilidade, com efeitos como redução de tamanho, inversão de comandos ou transformação em criaturas vulneráveis. O impacto é imediato e altera o ritmo das lutas, introduzindo um elemento caótico e bem-vindo à fórmula. Essas intervenções mantêm as partidas imprevisíveis e geram momentos memoráveis, especialmente em sessões multiplayer locais.

A progressão também é bem pensada. Personagens evoluem com o tempo, desbloqueando novos movimentos, melhorias e equipamentos. Há elementos leves de RPG, com itens equipáveis e power-ups que influenciam diretamente a abordagem de combate. Esses recursos estendem a longevidade do jogo e incentivam o retorno às fases. No entanto, há uma falha importante: durante o modo cooperativo local, o segundo jogador não consegue visualizar sua árvore de habilidades ao subir de nível. Isso obriga tentativas no escuro ou pausas para consulta externa, o que quebra o ritmo e prejudica a fluidez da sessão cooperativa. É um detalhe técnico que precisa de atenção.

Mesmo com esse ponto negativo, o conjunto de mecânicas — principalmente a metamorfose e as maldições — forma uma base sólida. A jogabilidade se mantém variada, com espaço tanto para a estratégia quanto para o improviso. Heroes of Mount Dragon não reinventa o gênero, mas atualiza suas fórmulas com decisões inteligentes e bem executadas.

A Alma Vibrante de Üna

Se Heroes of Mount Dragon é uma sinfonia de pancadaria, seus visuais e áudio são os elementos que articulam essa composição com precisão. O estilo visual é, sem dúvida, um dos pontos mais fortes do jogo. A combinação de arte 2D desenhada à mão com ambientes e animações 3D cria uma identidade marcante, que se destaca em meio à estética genérica de muitos títulos modernos. Essa abordagem resulta em cenários com profundidade e personalidade, e em personagens que parecem ter sido concebidos para uma campanha de RPG de mesa. Cada herói possui traços distintos e expressivos, sustentando a ideia de um mundo coeso e funcional.

A direção de arte, claramente influenciada por quadrinhos e animações clássicas, consegue capturar um apelo nostálgico sem se apoiar apenas nisso. O jogo apresenta uma paleta de cores bem escolhida e animações detalhadas, reforçando o esforço da equipe em criar um universo visualmente coeso. Essa estética conversa bem tanto com o público que cresceu em contato com esse tipo de material quanto com jogadores mais jovens, acostumados a visuais acessíveis e de fácil leitura. A escolha artística, alinhada ao material literário da franquia, reforça a consistência entre o jogo e os livros.

No entanto, o jogo sofre com a repetição visual. Apesar da presença de oito cenários diferentes divididos em atos, muitos deles compartilham composições e estilos semelhantes. A variação de fundo, embora bem executada em termos técnicos, não é suficiente para evitar a sensação de repetição. Isso também afeta a percepção de progressão visual ao longo da campanha. É um reflexo comum em produções de menor orçamento, onde a criação detalhada de ativos visuais pode limitar a diversidade de ambientes. O mesmo vale para o design dos inimigos, que, embora funcionais, carecem de variedade significativa.

No áudio, o jogo se mostra igualmente cuidadoso. A trilha sonora é bem composta e se encaixa no ritmo do combate sem se tornar intrusiva ou cansativa. Os efeitos sonoros são bem balanceados, transmitindo impacto sem recorrer à repetição exaustiva. A possibilidade de personalizar o volume de diferentes canais de áudio é um recurso simples, mas valioso para adequar a experiência ao gosto de cada jogador.

A narração tem papel central na ambientação do jogo. A entrega é eficaz, e ajuda a estabelecer o tom da aventura e o universo de fantasia proposto. Funciona como um fio condutor para os eventos, compensando a ausência de cutscenes mais complexas. No entanto, como já mencionado, a ausência de dublagem nas falas dos personagens compromete parte da imersão narrativa. Muitos jogadores tendem a ignorar textos não narrados, o que é um risco especialmente em um jogo com uma lore já estabelecida e rica como essa.

Ainda assim, o trabalho sonoro como um todo contribui positivamente para a imersão. Em especial, o áudio serve como um elemento de apoio importante quando os cenários começam a parecer repetitivos. Mesmo com a limitação visual, o design de som sustenta a ambientação e mantém o envolvimento durante o combate.

O Coração da Besta Digital

Como jogador de PC, desempenho é um aspecto central na avaliação de qualquer título. Heroes of Mount Dragon apresenta requisitos de sistema modestos, o que o torna acessível a uma ampla gama de sistemas. Isso amplia seu alcance e reforça a ideia de que o jogo foi pensado para rodar bem mesmo fora dos setups de ponta.

Minha experiência foi bastante sólida. Testei o jogo em um sistema com Ryzen 5 3600, RTX 4060 e 32 GB de RAM dual channel a 3200 MHz. O desempenho manteve-se estável, com média de 130 FPS. A resposta era imediata, e não notei quedas de quadros, travamentos ou stutter que pudessem comprometer o ritmo de jogo. A otimização, nesse cenário, parece bem ajustada — permitindo que a ação flua sem interrupções.

Um ponto técnico, no entanto, chamou atenção: a temperatura da GPU. Durante as sessões, minha RTX 4060 operava frequentemente na faixa dos 70°C. Para um jogo com estilo visual estilizado e baixa exigência gráfica aparente, essa temperatura é incomum, considerando que outros títulos mais pesados, no mesmo sistema, não alcançam essa faixa térmica. Isso pode indicar um uso ineficiente da GPU, possivelmente relacionado à forma como o motor gráfico lida com renderização em tempo real em placas mais recentes. Embora não afete diretamente a jogabilidade, esse comportamento sugere que ainda há espaço para ajustes no gerenciamento térmico e no uso de recursos em hardware mais robusto.

O Legado do Dragão que Acabou de Despertar

“Heroes of Mount Dragon” é o tipo de jogo que não pede permissão — ele entra em cena chutando portas, reacendendo a chama de um gênero que muitos já davam como extinto. Em minha jornada por Üna, fui cativado por um brawler que, embora não seja perfeito, brilha com uma intensidade que poucos títulos independentes conseguem alcançar.

Seus pontos fortes são inegáveis e, para mim, definem a experiência: o estilo de arte é uma obra-prima visual, com “visuais deslumbrantes desenhados à mão com animação vibrante e estilo de desenho animado” que conferem ao jogo um charme único e inesquecível. O combate é uma dança fluida de golpes e transformações, onde a mecânica “impressionante” de metamorfose dracônica é o coração pulsante da diversão, oferecendo uma dinâmica de combate variada e poderosa que nunca cansa. As opções robustas de multijogador, tanto cooperativas quanto competitivas, garantem que a diversão seja sempre compartilhada, promovendo tanto a camaradagem quanto a rivalidade entre amigos. E as “maldições hilárias” são um toque de gênio, adicionando uma camada única, imprevisível e divertida à jogabilidade, permitindo virar o jogo de maneiras que me arrancaram gargalhadas genuínas. A experiência de desenvolvimento veterana da RuniQ é palpável em cada detalhe, e a apresentação de áudio, com sua música excelente e narração envolvente, é um ponto alto que compensa em parte a repetição visual em alguns níveis.

No entanto, seria negligente não apontar as áreas onde o jogo ainda pode crescer. A “falta de variedade nos ambientes do jogo” e nos encontros com inimigos é um calcanhar de Aquiles que pode levar a uma “sensação crescente de monotonia” após algumas horas. O número inicial de heróis, embora oito sejam prometidos e parte integrante da propriedade intelectual mais ampla, pode parecer um pouco limitado no lançamento. E, como observei em minha própria análise e em outras, pequenas falhas técnicas e problemas de interface do usuário ainda precisam de polimento. A ausência de dublagem para os diálogos, apesar da rica lore, é uma oportunidade perdida de aprofundar a imersão narrativa.

Mas, ao final de tudo, essas são apenas pequenas nuvens em um céu que, para mim, é predominantemente ensolarado. “Heroes of Mount Dragon” é a prova de que a paixão, a experiência e uma visão clara podem transcender as limitações de um estúdio independente. Ele não é apenas um jogo; é um convite para reviver a glória dos brawlers clássicos, mas com uma roupagem moderna e um poder dracônico que o eleva a um patamar próprio.

Nota
Geral
8.5
review-heroes-of-mount-dragon-pc“Heroes of Mount Dragon” é um sopro de vida renovado para os brawlers clássicos, unindo nostalgia e inovação com paixão e competência. Apesar de algumas limitações, ele se destaca como uma experiência vibrante, desafiadora e cheia de personalidade — um dragão que veio para ficar.