São necessárias duas linhas de conclusão para se sentir desapontado com Grand Theft Auto The Trilogy: Definitive Edition. A realização de que esse pacote precisava de mais tempo no forno, e a realização plena de que o que a gente quer, e, quando queremos e ficamos querendo por muito tempo, esse tempo pode ser um longo período em anos e até décadas.

Quando finalmente você tem em mãos o que supostamente queria, descobre que não exatamente gosta mais das mesmas coisas, e que o tempo seguiu em frente e tivemos ótimos substitutos de nossas memórias tão suaves e provavelmente a gente desdenhou de várias destas propostas.

Grand Theft Auto III apresenta ao mundo dos desenvolvedores e aos consumidores, a forma ideal para expandir largamente um mundo 3D, que antes foi estabelecido com Super Mario 64. O game da Nintendo ensina a todos, sem exceção, como devemos nos portar no ambiente em três dimensões, de forma elegante e principalmente divertida. Depois dele, tivemos jogos que ajustavam esse marco, melhorando ainda mais a relação com polígonos e gameplay. Um exemplo pleno disso é o próprio Ocarina of Time.

Os veículos estão saturando o assunto “bugs & coletânea GTA”, no entanto nem sempre analisam os jogos em si, já que todos os três podem ser jogados sem problemas maiores, desses que impedem o jogador continuar seu progresso, independente se ele gostou ou não das escolhas estéticas. Por isso vou incluir uma crítica a cada um dos três games.

Começando por Grand Theft Auto 3, ele recebe menos tratamento radical no visual e soa como se isso fosse uma decisão, algo esperado por parte dos desenvolvedores. Existe uma sensibilidade e respeito, só que acabou se misturando com a pressa do executivo, que afoito, levou uma torta na cara.

Grand Theft Auto III – The Definitive Edition
Grand Theft Auto III – The Definitive Edition

GTA 3 ainda não tinha o primor nas atuações vocais e na verdade põe Claude, o seu personagem mudo, no trilho de um office boy marginal, que repetidamente executa tarefas num tom de subordinado que casa com uma vontade do jogo de ainda ser um videogame mais puro, que só está ali arranjando desculpas para construir missões diferentes, com regras diferentes das outras.

Porém não estou certo de que isso funciona bem hoje em dia Não colocado desta maneira, onde, mesmo com os ajustes ditos em relação aos controles (principalmente pelo fato de que agora tem controle total sobre a câmera), a parte de tiro é lastimável, a ponto de soar como Driv3r, onde fazer missões a pé, que envolvem atirar, parecem improvisadas, desbalanceadas e jogadas de qualquer jeito.

Isso está mais forte em Vice city, aliás. Isso pelo fato daquele jogo ter ainda mais fases em que menos se foca no título do jogo e mais se colocam missões envolvendo tiroteios. Mas ainda em GTA 3, Claude está aproveitando a fuga de figuras bem mais importantes do que ele. Dentro de um furgão, onde todos estão, a correria é para cada um tomar seu rumo depois que os bons homens capangas do figurão, interceptam o comboio policial e libertam as pessoas, até as que eles nem se importam.

Agora, vamos ser capacho de italianos, enquanto fingimos esquecer que temos traidores, esses que não só lhe colocaram na cadeia, mas também atiraram em você.

Grand Theft Auto Vice City – The Definitive Edition
Grand Theft Auto Vice City – The Definitive Edition

Em Vice City, Tommy Vercetti é mau humorado, possui voz sim (Ray Liotta) e não parece estar afim de estar na paradisíaca cidade. Diretamente de Liberty City (GTA III, GTA IV), ele pousa nesta Miami imaginária para concluir negócios em nome de um mafioso da metrópole. A negociação de drogas vai pro espaço quando a polícia tática bagunça a festa, os traficantes morrem e você consegue fugir. Só que agora você está em débito com o mafioso e puto da cara, tentando descobrir quem armou a cilada.

Já em San Andreas, Carl Johnson está de volta ao lar depois de anos ausente. O falecimento de sua mãe reúne os irmãos e agregados de gangue, revelando que, além de todos estarem envolvidos no mundo do crime, existe uma espécie de crise familiar, mas a família deles é a gangue de Grove Street. A partir daí, você se envolve em esquemas criminais, chantagens policiais, romances e traições.

Grand Theft Auto San Andreas – The Definitive Edition
Grand Theft Auto San Andreas – The Definitive Edition

CJ é bastante de ouvir, mas sua personalidade está mais presente do que a dos outros dois protagonistas. Aqui, conseguimos de vez nos livrar de sermos o garoto marginal de recados, para estarmos no mesmo nível ou num nível acima de seus comparsas de crime. As decisões são tomadas em grupo, e apesar de “Oh, Shit. Here We Go Again”, você sabe muito bem o que está fazendo e que quer muito bem tudo que propõe.

Em miúdos, é hora de tocar o terror nesta Califórnia imaginária, além de uma San Francisco e uma Las Vegas, agregadas. Isso faz com que o grande chamariz deste GTA seja o tamanho, e a variedade de ambientes.

Uma regra se repete ao jogar os três games: mesmo imbuído de nostalgia, chega um momento tão breve, que faz com que a gente já encha o saco e o jogo passe a ficar pouco atrativo, pois embaixo das melhorias que clamaram, e até mesmo de tantos erros, há o fato de que revisitar esses jogos desafiam a nostalgia, e não vai ser algo que vamos viciada e consecutivamente perseguir.

Depois de um tempo, essa conferida nostálgica vira falta de vontade de jogar. Não há muito mais a ser visto ali. Nem podemos contar com alguns floreios que ajudavam a iluminar cada rua. Eu estou falando das várias músicas retiradas dessa coleção por causa de licenciamento.

E para os novatos nos GTA 3D clássicos? Sobra um jogo que não acredito que vá atrair, a não ser pela curiosidade arqueológica. E do mesmo jeito, a curiosidade termina junto com a nostalgia do indivíduo nostálgico.

Aí então, a tese do Nakey Jakey vem à tona e forte como um tsunami: o game design da Rockstar é ultrapassado. 20 anos foram suficientes para aceitarmos já, que essa magia foi superada.

Eu diria que o nostálgico vai querer visitar as ruas de San Andreas de vez em quando – contanto que estejam dispostos a reservar sempre 22GB em seus SSDs de Xbox ou PlayStation (sem contar com os outros 2 games). Mas essa visita se tornará suficiente em poucos minutos ou horas, muito longe das muitas horas que cada jogo pede para alcançarmos o fim.

É quase vergonhoso que, os jogos em modo performance rodam a 60 frames mas não em 4K nativo, e o modo fidelidade não passa de 30fps. Pessoalmente, eu teria excluído a opção de escolha de modos (que acho que é algo que diz um pouco sobre a geração que ainda vai começar), e deixaria o jogo no modo de 60 frames.

Para você que não viu as compilações de bugs e coisas mal feitas nessas compilações, temos coisas do tipo a chuva (que não é agradável de ver) que cai mesmo quando estamos embaixo de uma cobertura; Os personagens atravessando objetos dentro ou fora de cutscenes; os corpos de pessoas caídas que atravessam o chão, como se estivessem num líquido boiando; as texturas de letreiros, que deve ter sido processadas por machine learning, junto com as texturas da cidade.

Isso faz com que tenhamos erros de digitações nas palavras impressas em cartazes e dizeres; A lista é um pouco extensa e os próprios patches que são lançados aos poucos denunciam isso. Eu achei que estava maluco e que seria preciso uma comparação lado-a-lado para perceber as melhorias desses updates, mas depois eu vi a reclamação das pessoas, de que muito do que clamaram terem consertado, ainda está presente.

Por outro lado eu gosto do efeito de iluminação, que bate nos modelos de personagens e parecem bonecos de plástico – melhor do que as texturas mortas e sem brilho da era PS2. Os NPC’s mais aleatórios não são nada legais de se ver, porém. Os efeitos de névoa, brilho de postes, prédios, reflexões, achei todos bem vindos e acima do que eu esperava. Sim, eu esperava um remaster apenas com resolução maior e menos serrilhado – como muitos fazem.

Algo devia estar ocorrendo com o lançamento desta compilação. Não à toa, a imprensa só recebeu a cópia para análise, juntamente com o lançamento do game nas lojas digitais (inclusive no PC, você poderia comprar, porém não poderia jogar devido a um erro no launcher). Como a versão de nova geração de Grand Theft Auto V foi adiada, os olhos da produtora se voltaram à GTA The Trilogy, possivelmente ainda um pouco longe de estar em estado de saúde para ser lançado. De qualquer forma aí está o jogo para todos.

 

Nota
PONTUAÇÃO GERAL
6.5
analise-gta-the-trilogy-definitive-editionA trilogia da franquia mais popular dos últimos 20 anos parece servir para desanimar pessoas que tinham na cabeça um jogo excitante até o fim para ser jogado em 2021 e também para aqueles que só queriam ver o jogo funcionar bem por meia hora e seguirem suas vidas. Ambas não estão erradas em suas decepções, mas o fator que mais complica é que isso tudo custa 300 reais para nós, fazendo o pacote ser bem indigesto, além de não usar bem os truques que um Nintendo Switch poderia oferecer. A versão analisada foi a do PlayStation 5, porém também pude experimentar a versão de San Andreas no Game Pass no Series X.